Teve início na última semana em todo o país a vacinação contra a Covid-19. Disponível em quantidade ainda muito inferior à necessária para a imunização de toda a população, as vacinas são destinadas, neste primeiro momento, a públicos prioritários: os primeiros que devem receber o imunizante são os profissionais de saúde que estão na linha de frente do combate à pandemia, a população idosa residente em instituições de longa permanência e comunidades indígenas.
Entretanto, assim que os municípios começaram a aplicar as doses, surgiram notícias de pessoas que não fazem parte dos grupos prioritários, mas foram vacinadas. Mais do que um desrespeito com o público que deveria ser priorizado na imunização, a conduta, quando cometida por agente público, configura ato de improbidade administrativa, além de poder ser enquadrada como crime, passível inclusive de pena de reclusão. “A chegada da vacina traz muita esperança a toda a sociedade, que vive há quase um ano em estado de permanente preocupação em decorrência da pandemia. A ocasião demanda especial e atento monitoramento dos órgãos públicos que devem zelar para que os mais vulneráveis sejam os primeiros a serem imunizados, conforme estabelecem os planos de vacinação. E é nessa direção que o Ministério Público do Paraná vem atuando”, pontua o procurador-geral de Justiça, Gilberto Giacoia.
Planos de Vacinação – O procurador de Justiça Marco Antônio Teixeira, coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção à Saúde Pública, explica que cabe aos gestores federal, estadual e municipais a definição dos grupos prioritários para a aplicação das vacinas. “O Ministério Público atuará em permanente vigilância para garantir que tais planos sejam devidamente elaborados, implementados e aperfeiçoados em cada um dos municípios paranaenses e para que seja devidamente apurado qualquer ato de desrespeito aos critérios definidos, e os envolvidos sejam responsabilizados”, explica.
No Paraná, seguindo o Plano Nacional de Vacinação contra a Covid-19, a estratégia estadual definiu como públicos prioritários para a primeira etapa os profissionais de saúde que aplicarão as vacinas, as pessoas com mais de 60 anos que residem em Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) e os trabalhadores que atuam nesses locais, a população indígena e todos os funcionários de unidades de saúde que atendem pacientes com suspeita ou confirmação de infecção pelo coronavírus. A partir do Plano Estadual, os municípios devem elaborar seus planos de ação, o que ainda não tinha sido feito por 179 municípios, segundo levantamento do Centro de Apoio.
Atuação conjunta – Para executar tal fiscalização, o Ministério Público do Paraná atua em conjunto com outros órgãos públicos, como os Tribunais de Contas do Estado e da União e as Controladorias-Gerais do Estado e da União, a partir da Rede de Controle da Gestão Pública no Paraná, atualmente coordenada pelo MPPR. “O objetivo é cobrarmos transparência na execução dos planos de vacinação e o fiel cumprimento das normas legais e das decisões adotadas pelas autoridades gestoras do SUS. Também monitoraremos a regularidade das compras das vacinas e dos insumos necessários para a sua aplicação”, explica o procurador de Justiça Maurício Kalache, que coordena o Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção ao Patrimônio Público e à Ordem Tributária e atualmente é também coordenador da Rede de Controle.
Agentes públicos – “O Ministério Público tem plena confiança nos gestores de saúde do estado do Paraná e a instituição atuará para que as estratégias das autoridades sanitárias sejam executadas e respeitadas. Contudo, eventuais desvios de legalidade são necessariamente apurados e os envolvidos responsabilizados”, afirma Maurício Kalache. O procurador de Justiça explica ainda que, quando cometido por agentes públicos (prefeitos, secretários ou demais funcionários públicos que não estão na lista de prioridade), o ato de “furar a fila” da vacinação constitui improbidade administrativa. “Utilizar-se do cargo público para obter benefício pessoal contraria regras e princípios que disciplinam a boa gestão pública”, diz. Entre as penas previstas pela legislação nesse caso, estão a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos, o pagamento de multa e o ressarcimento de valores ao erário. Kalache destaca ainda que considera importante que a sociedade auxilie no controle dos planos de vacinação, fiscalizando e denunciando eventuais irregularidades constatadas. A participação comunitária e o controle social são fundamentais para o funcionamento do Sistema Único de Saúde, por isso, além dos usuários em geral, os membros dos conselhos estadual e municipais de saúde devem acompanhar todas as fases da execução dos planos estadual e municipais de vacinação.”
Crime – Além das consequências na esfera cível, quem desrespeita a fila da vacina também pode sujeitar-se à responsabilização criminal, como explica o procurador de Justiça, Cláudio Rubino Zuan Esteves, coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais, do Júri e de Execuções Penais. “Nos casos em que o desvio tiver o envolvimento de funcionário público, a prática pode caracterizar os crimes de peculato, corrupção ou mesmo abuso de autoridade. Se a expropriação das doses do poder público for realizada por um particular, pode-se falar dos crimes de subtração de material destinado a salvamento, eventual furto ou mesmo roubo, além de ser possível também a tipificação de delitos relacionados a falsidades documental, de identidade ou de atestados médicos e, até mesmo, estelionato contra entidade pública, contando, os crimes mais graves, com penas máximas de 12 anos”, alerta. Além disso, o promotor de Justiça Ricardo Casseb Lois, que também atua no Centro de Apoio, salienta que, por se tratarem de crimes cometidos durante estado de calamidade pública, como é o caso da pandemia, as penas podem ser ainda agravadas. “À medida que situações como esta chegarem ao conhecimento do Ministério Público, serão adotadas providências para a identificação dos autores, podendo o próprio promotor de Justiça instaurar investigações ou requisitar sua instauração à Polícia Civil”, esclarece.
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