Lei Federal nº 11.738/08 é referência para reajuste do piso nacional do magistério

A Lei Federal nº 11.738/08, que dispõe sobre o piso salarial nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, deve continuar sendo usada pelos entes federativos como referência para a fixação e reajuste do piso nacional dessa categoria profissional, estabelecido pela Lei nº 14.113/20, até que sobrevenha nova lei específica para regulamentar o tema, nos termos do artigo 212-A, XII, da Constituição Federal (CF/88).

Como a Lei nº 11.738/08 está em plena vigência, o município continua tendo direito ao complemento da União na forma e no limite do disposto no inciso VI do caput do artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e em regulamento, a fim de viabilizar a integralização de que trata os artigos 3º e 4º dessa lei.

A Lei nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF), em seu artigo 22, parágrafo único, inciso I, autoriza que, nos casos em que o reajuste salarial derive de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, o ente público promova a equiparação salarial dos professores da educação básica com o piso salarial profissional nacional, mesmo ultrapassando o limite prudencial de gastos com pessoal. Assim, considerando que o reajuste salarial deriva de determinação legal, ele é autorizado mesmo se o ente tiver extrapolado o limite de despesa com pessoal.

O piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério para o ano de 2022 foi definido por meio da Portaria nº 67/22 do Ministério da Educação (MEC), em observância às disposições da Lei Federal nº 11.738/08, razão pela qual não há que se falar em reposição inflacionária com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

A Lei nº 11.738/08 tem por finalidade regulamentar o piso salarial nacional profissional, ou seja, o menor salário a ser pago aos professores da educação básica em todo o país, o qual não poderá ser inferior ao estabelecido em lei e no regulamento do Ministério da Educação. Portanto, exclui-se da finalidade dessa lei a correção a todos os demais níveis e classes de eventual carreira do magistério nos diversos entes federados.

Assim, a correção aplicada aos salários dos professores da educação básica, visando a equiparação dessas remunerações ao piso nacional profissional, não se aplica ao pagamento de subvenções relativas ao incremento de plano de cargos e salários por parte dos entes públicos em relação aos servidores da Educação.

Essa é a orientação do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pelo Município de Paranacity (Região Norte), por meio da qual questionou se, com a edição da Lei nº 14.113/20, que revogou a Lei Federal nº 11.494/07, a Lei Federal nº 11.738/08 continua a ser referência para a fixação e reajuste do piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério da educação básica pública.

Instrução do processo

A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR afirmou que a Lei nº 11.738/08 não foi revogada e, desse modo, pode ser utilizada como parâmetro para o estabelecimento do piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério da educação básica pública.

A unidade técnica lembrou que a fixação desse piso salarial compete à União, por meio da edição de lei federal, mas nada impede que os municípios fixem piso salarial local para os profissionais da educação escolar, desde que ele não seja inferior ao piso estabelecido nacionalmente, atualmente regulamentado por portarias do MEC.

A CGM ressaltou que a União deverá complementar a integralização do piso salarial nos casos em que o ente federativo não tenha disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado.

A unidade técnica salientou que a extrapolação do limite de despesas com pessoal não constitui óbice para o pagamento do piso nacional, ainda que isso implique aumento de gastos, pois a própria LRF estabelece que as determinações legais são exceção às proibições impostas aos gestores quando o município tiver superado o limite legal de pessoal.

O Ministério Público de Contas (MPC-PR) frisou que, enquanto não sobrevier a lei específica exigida pelo artigo 212-A, XII, da Constituição Federal, deve ser admitida a utilização da Lei nº 11.738/08 para promover a atualização do piso salarial do magistério público da educação básica. O órgão ministerial destacou que devem ser utilizados, para o ano de 2023, os parâmetros já fixados pelo MEC na Portaria nº 17/23, vedada a mera reposição inflacionária medida pelo INPC.

O MPC-PR acrescentou que a atualização do piso salarial do magistério público da educação básica deverá ser implementada ainda que o ente federativo se encontre em extrapolação do limite de despesa com pessoal. Mas lembrou que, nesse caso, o reajuste deve ser aplicado apenas aos níveis da carreira que se encontrem abaixo do novo piso.

Legislação e jurisprudência

O inciso X do artigo 37 da Constituição Federal dispõe que a remuneração dos servidores públicos e o subsídio dos agentes políticos somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices. O inciso VIII do artigo 206 da CF/88 estabelece que deve ser fixado um piso salarial nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.

O artigo 212-A do texto constitucional fixa que os estados, o Distrito Federal e os municípios destinarão parte dos recursos da educação à manutenção e ao desenvolvimento do ensino na educação básica e à remuneração condigna de seus profissionais.

O inciso IV desse artigo dispõe que a União complementará os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). O inciso XII desse mesmo artigo expressa que lei específica disporá sobre o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério da educação básica pública.

O artigo 60 do ADCT estabelece que os valores mínimos, em percentuais, da complementação da União que deve ser implementada progressivamente, a partir de 1º de janeiro de 2021.

A Portaria nº 67/22 do MEC homologou o Parecer nº 2/2022/Chefia/GAB/SEB/SEB, de 31 de janeiro de 2022, da Secretaria de Educação Básica do MEC, que apresenta o piso salarial nacional dos profissionais do magistério da educação básica pública para o ano de 2022.

A Portaria nº 17/23 do MEC fixou os parâmetros para a fixação e reajuste do piso salarial nacional dos profissionais do magistério da educação básica pública para o ano de 2023.

A Lei Federal nº 11.738/08 (Lei do Piso Nacional do Magistério) fixou um valor mínimo a ser recebido como vencimento pelos profissionais do magistério.

O artigo 3º da Lei nº 11.738/08 expressa que o valor do piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica passou a vigorar a partir de 1o de janeiro de 2008, e sua integralização, como vencimento inicial das carreiras dos profissionais da educação básica pública, pela União, estados, Distrito Federal e municípios será feita de forma progressiva e proporcional.

O artigo 4º da Lei nº 11.738/2008 fixa que a União deverá complementar, na forma e no limite do disposto no inciso VI do artigo 60 do ADCT e em regulamento, a integralização de que trata o artigo 3o, nos casos em que o ente federativo, a partir da consideração dos recursos constitucionalmente vinculados à educação, não tenha disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado.

O parágrafo único do artigo 4º da Lei nº 11.738/08 estabelece que a atualização de que trata o  artigo será calculada utilizando-se o mesmo percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente, nos termos da Lei no 11.494/07.

O artigo 5º da Lei nº 11.738/08 (Lei do Piso) dispõe que o piso salarial profissional nacional do magistério público da educação básica será atualizado, anualmente, no mês de janeiro. O parágrafo único desse artigo estabelece que essa atualização será calculada com base no mesmo percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente, nos termos da Lei nº 11.494/07.

A Lei nº 14.113/20 regulamenta o Fundeb, de que trata o artigo 212-A da Constituição Federal, revoga dispositivos da Lei nº 11.494/07 e dá outras providências.

O inciso I do parágrafo único do artigo 22 da Lei nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF) expressa que, se a despesa total com pessoal exceder a 95% do limite, são vedados ao poder ou órgão que houver incorrido no excesso a concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do artigo 37 da Constituição.

O Acórdão nº 3666/17 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 223512/17) fixa que o reajuste não incide automaticamente sobre as demais gratificações, mas somente para o piso salarial dos professores. E acrescenta que as gratificações fixadas em percentual do piso terão, consequentemente, igual aumento.

O Acórdão nº 2270/18 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 676797/17) dispõe que é obrigação do município repassar os reajustes do piso nacional; e que esses reajustes atingirão apenas os vencimentos básicos, sem promover reflexos sobre as demais vantagens e gratificações, tampouco sobre efetivação de reescalonamento, já que estruturação é prerrogativa dos entes federativos e não está atrelada ao piso salarial.

O Acórdão nº 1294/19 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 30413-7/19) estabelece que a revisão geral anual é garantida pelo inciso X do artigo 37 da CF/88 e expressamente ressalvada pela LRF, mesmo na hipótese de extrapolação do limite de gastos com pessoal.

O Acórdão nº 3864/19 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 43475-4/18) fixa que é vedado pagamento retroativo com base no reajuste do piso nacional previsto na Lei Federal nº 11.738/08, pois o objetivo dessa lei é garantir o valor mínimo a ser pago ao nível inicial da carreira do magistério, sem que haja qualquer previsão para estender o índice de atualização aos demais níveis da carreira que estejam fixados em patamar superior.

O Acórdão nº 28/23 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 148094/22) dispõe que o ente público pode realizar o pagamento do piso salarial do magistério com fundamento na Portaria nº 67/22 do MEC, em razão da presunção de constitucionalidade dos atos normativos. Portanto, a princípio, tal reajuste não configura desrespeito às disposições do artigo 212-A, inciso XII, da Constituição Federal, a não ser que seja reconhecida a violação em sede de controle de constitucionalidade.

Decisão

O relator do processo, conselheiro Augustinho Zucchi, afirmou que a Lei Federal nº 11.738/08 está em vigor e dispõe sobre o piso salarial nacional para os profissionais do magistério público da educação básica. Portanto, o relator entendeu que ela deve continuar sendo usada pelos entes públicos como referência para a fixação e reajuste do piso nacional dessa categoria profissional, estabelecido pela Lei nº 14.113/20, até que sobrevenha nova lei específica para regulamentar o tema.

Zucchi lembrou que o MEC já confirmara esse entendimento ao realizar, por meio de portarias, as atualizações do piso nacional para os anos de 2022 e 2023 com fundamento nas disposições do artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 11.738/08.

O conselheiro ressaltou que o TCE-PR já se manifestara no sentido da possibilidade da aplicação da Lei nº 11.738/08 (Acórdão nº 28/23 – Tribunal Pleno – Consulta nº 148094/22), ao reconhecer a validade do piso nacional fixado pela Portaria nº 67/22 do MEC.

O relator também lembrou que a LRF autoriza que o ente público promova a equiparação salarial dos professores da educação básica com o piso salarial profissional nacional, mesmo que isso represente ultrapassar o limite prudencial de gastos com pessoal. Ele destacou que esse entendimento fora confirmado pela jurisprudência do TCE-PR – Acórdão nº 1294/19 – Tribunal Pleno (Consulta nº 434754/18).

No entanto, Zucchi reforçou que, ultrapassado o limite prudencial de gastos com pessoal, o ente público deve diligenciar para promover, no prazo legal, as adequações orçamentárias devidas, a fim de voltar para o limite de gastos.

Zucchi afirmou, ainda, que é inadequada a utilização do INPC como índice de correção salarial para os profissionais do magistério público da educação básica, até mesmo porque as atualizações do piso nacional para os anos de 2022 e 2023 foram realizadas por meio de portarias do MEC.

Finalmente, o conselheiro ressaltou que a Lei do Piso tem por finalidade regulamentar o menor salário a ser pago aos professores da educação básica em todo o país; e, assim, está excluída da sua finalidade a correção a todos os demais níveis e classes de eventual carreira do magistério nos entes federados.

Os conselheiros aprovaram o voto do relator por unanimidade, na Sessão de Plenário Virtual nº 4/24 do Tribunal Pleno do TCE-PR, concluída em 14 de março. O Acórdão nº 695/24 foi disponibilizado em 27 de março, na edição nº 3.177 do Diário Eletrônico do TCE-PR. O processo transitou em julgado em 9 de abril.

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